Os heróis da fé

Às vezes, tenho a impressão que a história me pregou uma peça ao não permitir que eu participasse das vidas de outras pessoas.

Eu quisera poder retornar no tempo e assentar-me aos pés de Abel, Enoque e Abraão para aprender com eles, através do seu exemplo de vida e integridade, as mais sublimes lições de fé e esperança.

Eu quisera entrevistar José, o filho de Jacó e Raquel; aquele que, pela fé, migrou de uma cisterna fria para o palácio de Faraó.

Eu quisera também caminhar pelas estradas poeirentas da Palestina e reconstituir os passos de Jesus e seus discípulos.

Eu quisera participar das dores de Pedro, da aflição de Tiago e da alienação de Tomé, testemunhando in loco a transformação de suas vidas.

Eu quisera mais… quisera subir o Calvário ao lado de Simão, o Cireneu, e ajudá-lo a carregar a cruz para aliviar o sofrimento de Jesus!

Ah! Como eu quisera ter caminhado ao lado desses heróis da fé e aprender com eles a viver pela fé.

Vivemos em um tempo de escassez de heróis; tempo em que as pessoas têm procurado heróis nas bancas de jornal e prateleiras de supermercados.

Os heróis da fé se distinguem desses heróis factóides. São homens e mulheres que constroem e pavimentam a “estrada da fé”.

Qual o perfil dos heróis da fé?

1. Os heróis da fé são aqueles que firmam um pacto com a esperança.

Somente aqueles que carregam em seus corações uma reserva inesgotável de esperança podem ser considerados dignos de ser chamados de heróis da fé. Em Hebreus 11. 1 está escrito que “a fé é a certeza das coisas que se esperam”. Aquele que espera nutre a esperança em obter aquilo que é desejado.

O profeta Jeremias, no ápice de sua lamentação, bradou: “Quero trazer à memória o que me pode dar esperança” (Lm 3. 21). Povo de Deus, não se esqueça disso: Os verdadeiros heróis da fé são homens e mulheres cujas memórias estão comprometidas com a esperança!

2. Os heróis da fé são aqueles que têm consciência da transitoriedade de sua missão.

Eles admitem a fugacidade da vida ao confessarem que são “estrangeiros e peregrinos sobre a terra” (Hb 11. 13b). Eles aspiram a uma pátria superior que é a celestial. Não olham para trás porque acreditam no seu projeto de vida. Sabem que a sua vida é passageira e não podem perder tempo com coisas irrelevantes e sem valor.

3. Os heróis da fé são aqueles que, por sua fé, obtêm bom testemunho.

O texto de Hebreus 11. 2 diz que “pela fé, os antigos obtiveram bom testemunho”. Significa que as suas ações são mencionadas, seus exemplos são citados, sua conduta é imitada, seus feitos se tornam célebres, sua bravura é reconhecida.

Em Hebreus 11. 33-39, o autor transforma em crônica os atos de bravura dos heróis da fé citados na Escritura Sagrada.

Diz o texto que “por meio da fé, subjugaram reinos, praticaram a justiça, obtiveram promessas, fecharam a boca de leões, extinguiram a violência do fogo, escaparam ao fio da espada, da fraqueza tiraram força, fizeram-se poderosos em guerra, puseram em fuga exércitos de estrangeiros, mulheres receberam, pela ressurreição os seus mortos.

Alguns foram torturados, não aceitando seu resgate, para obterem superior ressurreição; outros, por sua vez, passaram pela prova de escárnios e açoites, sim, até de algemas e prisões. Foram apedrejados, provados, serrados pelo meio, mortos a fio de espada; andaram peregrinos, vestidos de peles de ovelhas e de cabras, necessitados, afligidos, maltratados (homens dos quais o mundo não era digno), errantes pelos desertos, pelos montes, pelas covas, pelos antros da terra”.

O texto encerra dizendo que “todos estes obtiveram bom testemunho”.

4. Os heróis da fé são aqueles que, a exemplo de Abel, mesmo depois de mortos ainda falam (Hb 11. 4b).

Toda pessoa que passa por nossa vida não passa sozinha nem nos deixa só. Ela leva um pouco de nós e deixa sempre um pouco de si. Os heróis da fé têm esse perfil.

São pessoas amáveis e carinhosas que se entregam dando o melhor de si, e que têm sempre um lugar especial em nossas mentes e corações. Eles nos ensinam a viver a vida com dignidade e iluminam os caminhos obscuros para que possamos trilhá-los sem medo e cheios de esperança.

Elas se doam por completo e, muitas vezes, renunciam aos seus próprios sonhos para que possamos realizar os nossos.

Os heróis mencionados no capítulo 11 da Epístola aos Hebreus marcaram as páginas da Escritura Sagrada. Existem heróis que marcam as páginas de nossas vidas. Eles entram em nossas vidas sem pedir licença, subjugam os nossos corações, e saem sem qualquer despedida.

A história do presbiterianismo está eivada de heróis desse tipo: Simonton, Schneider, Blackford, José Manuel da Conceição, Álvaro Reis, Erasmo Braga, Mathatias, Benjamin Morais, Júlio de Andrade, Amantino Adorno Vassão… infelizmente não tive o privilégio de conhecer nenhum deles pessoalmente!

Mas conheci um que arrebatou o meu coração. Seu nome era Zaqueu Ribeiro. Ele era muito especial! Ele foi um dos heróis que me permitiram driblar a História! Retórico brilhante, de mente cartesiana e raciocínio lógico, ele alternava entre a erudição e a simplicidade, a realidade e o sonho.

Sua presença era inspiradora, seu silêncio, pedagógico. Quando olhava à minha direita, lá estava o ancião que sem falar, apenas com um semblante grave e reverente, expressava um imperativo de encorajamento: “Vá em frente. Eu estou aqui para apoiá-lo”.

Sentia-me mais seguro quando ele se assentava comigo ao púlpito. Pena que só convivi com ele durante um ano! Mas valeu a pena! Quando dele nos despedimos, lembramo-nos da sua célebre “Oração da Noite”, a qual compôs ainda em vida: “Boa noite, Pai.

Termina o dia e a Ti entrego meu cansaço. Obrigado pela luz do dia em que caminhei; obrigado pelo pão que me alimentou; obrigado pelo serviço que realizei. Obrigado pela alegria de viver, pela esperança que me estimulou, pela segurança diante das batalhas, pela fé que me sustenta em Ti. Obrigado porque povoaste meu coração de gente que eu amo, que me põe de joelhos em prece intercessória.

Obrigado pelo lar que me faz família e pela Igreja que me faz Teu povo. Obrigado… obrigado… obrigado… é tudo”.

Neste momento, gostaríamos que ele estivesse aqui. Entretanto, dele resta a saudade, a lembrança de sua imagem e do som de sua voz que preenchem o vazio que ficou em seu lugar. Mas o que nos conforta é sabermos que este verdadeiro herói da fé está ao lado de Deus e feliz por ter cumprido sua missão.

(Sermão pregado pelo Rev. Eurípedes da Conceição, pastor efetivo da Igreja Presbiteriana da Tijuca, no Culto Matutino do dia 03 de fevereiro de 2002, como tributo ao Rev. Zaqueu Ribeiro).

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